quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

FÉRIAS 2


Durante os dias em que estive na Praia de Itaóca – E.S., um grupo de aproximadamente 30 homens fazia treinamento para o exercício da atividade de Guarda Vidas. Essa profissão é de suma importância em qualquer praia e, se considerarmos que o litoral do Espírito Santo é freqüentado majoritariamente por turistas mineiros que não convivem fora do verão com a realidade das águas marinhas, essa profissão se torna mais importante ainda.
Todas as manhãs bem cedinho, o grupo chegava à praia, liderado por um comandante tipo durão e um auxiliar. Eram exercícios físicos pesadíssimos e extenuantes, inimaginável para qualquer banhista no gozo de suas férias. Além dos exercícios na areia, o grupo era também submetido a exercícios dificílimos na água. Todos os testes e exercícios eram comandados por uma voz firme, dura e decidida de um comandante que sabia muito bem aonde queria chegar e com quais daqueles homens ele queria chegar.
Ao final de alguns exercícios, alguns eram eliminados mediante uma declaração de incompetência em alto e bom som, tendo uma platéia de banhistas como testemunha. Não adiantava os argumentos dos eliminados e nem suas lágrimas, a eliminação representava o fim de um sonho de ser Guarda Vidas.
Um dos exercícios que acompanhei comodamente à sombra do guarda-sol ouvindo a Ludmila Ferber cantando no MP3, consistia em todo o grupo segurar com uma das mãos um barbante mantendo-a fora da água, enquanto deveriam todos nadarem uns 600 metros mar adentro usando a outra mão e depois regressarem à praia. Seriam aprovados os que cumprissem todo o trajeto sem soltar o barbante e que não se afogassem. Dois candidatos ao final dessa prova viram seu sonho, literalmente morrer na praia, um não conseguiu nadar 40 metros e o outro teve que ser socorrido por um companheiro, pois não agüentou nadar com um braço e extenuado pediu socorro.
Fiquei impressionado com a dureza e o rigor de tal seleção, até prestar atenção nos argumentos do comandante a respeito da tarefa para a qual eles eram selecionados. A um dos excluídos ele disse: “Você está eliminado, pois a sua determinação não seria capaz de salvar nem uma criança caso esta estivesse em perigo de afogamento!” A outro ele disse: “Você está eliminado, pois o seu condicionamento físico colocaria em risco a vida de alguém cuja sobrevivência dependesse do seu esforço de salvamento!” Aos que foram eliminados na prova do barbante, ele acrescentou: “Vocês tiveram que nadar com um braço tendo que carregar um barbante e não conseguiram, e se tivessem que nadar carregando uma pessoa?”
É uma seleção dura, mas necessária para a função de Guarda Vidas. Confesso que me senti até motivado a arriscar algumas braçadas além das ondas, pois com certeza o grupo do comandante durão é muito bem treinado, desisti da idéia por preguiça própria de um ser em férias e pelo horror em imaginar um daqueles brutamontes fazendo respiração boca-a-boca! Cruz credo!

FÉRIAS 1




Coisa boa é parar num tempo de férias!

Assentado à beira mar, em Itaóca, Espírito Santo, olhando o vai-e-vem das ondas, o movimento sincronizado das gaivotas e as pessoas ao redor, cheguei a algumas conclusões sobre o tempo e a pressa.
Observo pessoas, as mais diversas: jovens, velhas, homens, mulheres, adolescentes, crianças, brancas, negras, índias, gente sarada e outras como eu nem tanto, mas todas sem nenhuma pressa, sem nenhuma correria. As férias tem esse poder mágico de fazer as pessoas desejarem uma letargia do tempo. E não é só isso, observo o quanto férias à beira-mar é igualitária: banhando-se na mesma água e brincando na mesma areia estão homens, mulheres, crianças, adolescentes e jovens de raças e classes sociais tão diferentes, de formação cultural, educacional e intelectual tão diferentes. Fico imaginando se não era essa a razão de Jesus gostar tanto da beira do mar, ou quem sabe, não formaríamos a igreja perfeita do ponto de vista relacional nesse espaço tão comum.
O tempo à beira-mar é preguiçoso e cada minuto é saboreado ao vento e cada segundo é sorvido até a última gota do santo ócio.
Interessante também como as pessoas conversam na areia da praia ou com o corpo mergulhado brincando com as ondas. Ninguém começa um bom papo dizendo a sua profissão ou ocupação geradora de renda. Igualmente, ninguém começa um bom papo apresentando sua credencial hierárquica. Um bom papo na praia, geralmente começa com assuntos prosaicos e considerados fúteis, provocados por encontros de guarda-sol, crianças trocando brinquedos, a espera de ser servido na fila de um churrasquinho, uma bolinha de frescobol que caiu na área do vizinho, etc. Por falar nisso, não sei o nome da maioria das pessoas com quem conversei na praia durante esses dias, de repente não saber o nome seja também uma maneira de esquecer a realidade do tempo que corre contra nós.
Outra maravilha das areias de uma praia é o tempo de cuidado com a saúde. Todas as recomendações médicas sobre colesterol e triglicerídeos, ficaram trancadas na casa do trabalho. Nutricionistas e seus conselhos são vistos como demônios na orgia culinária da beira-mar. Assentado á beira-mar podemos e devemos comer todas as frituras, todas as guloseimas, todos os açúcares, todos os salgadinhos (que só Deus sabe onde e que condições são feitos), todos os queijos empanados, todos os churrasquinhos... nunca ninguém morreu nesse tempo de comer sem pressa.
A praia é também o local mais democrático e humanista de exposição de corpos. A praia é o lugar que esconjura passarela e exalta o corpo comum. Ninguém é tão gordo que não possa estar na praia, ou magra, ou baixa, ou alta, ou corcunda, ou barriguda, ou descabelada... o sol e a areia acolhem a todos.
É uma pena que para a maioria de nós, esse tempo sem pressa na praia acontece só uma vez por ano!